Curadoria

Interpretação Curatorial

Em Por uma crise da imagem, fui atingida por referências imagéticas tão profundamente gravadas em mim que já não me lembro mais em que momento penetraram na minha mente.

Aos poucos, percebi que estava observando imagens que são um registro do resultado do tensionamento entre a compreensão de si mesmo e imagens sacralizadas pela cultura e pela história da arte hegemônicas.

No entanto, isso não foi feito em um movimento de confronto, mas em um relato de como essas imagens se fazem presentes em um imaginário pessoal, como se fossem duas verdades conflitantes cuja síntese é, no fim, a formação da subjetividade de alguém.

Enquanto meus olhos andavam pelas fotografias, também me conectei com minhas próprias referências e tudo passou a se sobrepor. O fluxo do meu pensamento foi interrompido por Rugendas e Malevich fundidos, descrevendo o conflito que as imagens dessa sala relatam. Nelas, vi a reinterpretação e a subversão de símbolos e imagens sacralizados pelo regime de representação vigente. São os rastros de uma relação dúbia, de familiaridade e estranheza, com as imagens religiosas e com os cânones da história da arte.

A subversão dessas imagens me pareceu a tentativa de provocar seu desgaste para que também seja enfraquecido o aparato representacional que nos condiciona a lidar com a realidade de forma binária,pela semelhança ou dissidência, onde apenas os semelhantes conseguem se enxergar nos referenciais imagéticos.

Fui sendo levada a uma segunda sala - de atmosfera mais intimista e levemente melancólica -, que me pareceu uma espécie de ato final, onde me senti imersa dentro do aspecto mais íntimo dessa relação ambígua: a formação do desejo.

As naturezas-mortas, os travesseiros, a fumaça e as relações dicotômicas entre peso e leveza; solidez e instabilidade; efêmero e permanente, pareciam me contar sobre um imaginário pessoal que revela o que esse alguém sabe e acredita sobre o amor romântico, solidão e ausência.

Karenn Amorim